domingo, 18 de abril de 2010

A VIZINHA SOU EU

Por dormir com as galinhas, como se diz nas cidades de Santo Antonio da Alegria e Altinópolis, onde cresci, acordei às 5.00 horas da manhã. Às 6.00 fiz o café do porteiro, já que hoje é domingo e a cozinha do prédio não abre. Li rapidamente os jornais. Acabei dormindo de novo assistindo o Globo Rural e acordei com programa de automobilismo, com a gritaria do Galvão Bueno. Após nova escovação dos dentes, resolvi passar outro café. Estava tão bom. Era um verdadeiro arábico do sudeste mineiro. Não podia deixar de partilhar o café com Sônia. Sônia é minha esposa. Que é dedicada a tudo. Aos amigos, ao filho, a nora e atualmente a Saskia, nossa neta, que fez a vida, que já era agitada pelas contas que nunca fechavam, renascer. Somente a ternura e a bondade desta mulher poderia suportar por mais de trinta anos um gênio irriquieto, às vezes angustiado e atormentado do marido. Que às vez fala sem pensar e até ofende causticamente, mesmo sem intenção. Voltando ao café. Estava tão bom que não poderia deixar de ser dividido. Àquela mulher de tantas virtudes, professora e pianista que não toca, tinha uma pequena dificuldade em sair de seu leito. Mesmo dormindo cedo. Acreditado na sua incomensurável boa fé fui sorrateiramente ao seu quarto e disse que uma vizinha estava ao interfone. Não sabia o nome. Disse a ela que pediria a vizinha que ligasse dentro de quinze minutos. Ela concordou. Antes de 15 minutos, algo raro, estava de pé, saltitante para atender o apelo da vizinha. Aliás, nunca se se furtou a se solidarizar com ninguém. O que era em casa. Era na rua, com parentes, com amigos, com estranhos. Sempre pronta, se não podia ajudar materialmente, externava afeto, solidariedade, amizade. Uma palavra de harmonia, paz, amizade, estímulo e fraternidade era a tônica de sua vida. Era religiosa, embora não precisasse pertencer a religião alguma. Seus atos se enquadravam em qualquer religião que falasse de amor. O amor verdadeiro. O amor "além da ninhada". A sua bondade era natural, não fazia esforço. Era sua vida que fluía na melhor forma de viver. Sem ambições pessoais, sem grandes vaidades. A sua bondade era até ingênua muitas vezes. Vivia seus dramas, que pela sua maneira generosa de ser eram poucos, mas incorporava o drama dos outros. Quando sentou-se saboreou o caríssimo café arábico, perguntou novamente pela vizinha, que não interfonava. Respondi, tranquilamente que a "vizinha sou eu". Em vez de chateação um sorriso, por entender naquele gesto de café dividido, um gesto de amor.

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