terça-feira, 13 de abril de 2010

UNIVERSIDADE DE RIBEIRÃO PRETO (UNAERP)
TEORIA DO ESTADO I - PROF. ANTONIO CALIXTO


DO ESTADO - Sociedade e Estado: Conceito de Sociedade. Relação entre Sociedade e Estado. Conceitos de Estado: (a) prisma filosófico, (b) prisma sociológico e (c) prisma jurídico. Introdução aos Elementos Constitutivos do Estado.

1 - Conceito de Sociedade - Por quê um termo abstrato e impreciso?
· Para Talcott Persons, seria "todo o complexo de relações do homem com seus semelhantes".
· Para Toennies, sob uma ótica mecanicista, seria "um grupo derivado de um acordo de vontades, de membros que buscam, mediante o vínculo associativo, um interesse comum, impossível de obter-se pelos esforços isolados dos indivíduos".
· Para Giorgio Del Vecchio, sob uma ótica organicista, seria "o conjunto de relações mediante as quais vários indivíduos vivem e atuam solidariamente em ordem a formar uma entidade nova e superior".

2 - As Teorias Organicistas e Mecanicistas da Sociedade
· Na concepção Aristotélica, o homem seria um "ser social", ou como diria Hugo Grotius, possuiria um "appetitus societatis". Por quê? Esta é uma posição organicista?
· Definição de organicismo para Del Vecchio: "reunião de várias partes, que preenchem funções distintas e que, por sua ação combinada, concorrem para manter a vida do todo".
· Organicismo: Supremacia da Sociedade sobre o Indivíduo. Mecanicismo: relativa autonomia do indivíduo dentro do "todo" formado.
· Podemos fazer analogias entre autoritarismo e liberalismo versus organicismo e mecanicismo?

3- Sociedade, Comunidade e Associação Política
· Para Toennies, Sociedade supõe a ação conjunta e racional dos indivíduos no seio da ordem jurídica e econômica, aonde, a despeito de todos os laços, os indivíduos permanecem separados. Comunidade implicaria na existência de formas de vida e organização social, onde impere essencialmente uma solidariedade feita de vínculos psíquicos.
· Sociedade: vontade arbitrária, organização, governo pela razão, simbolismo formal e ordenador.
· Comunidade: vontade essencial, substancial e orgânica; solidariedade mecânica; governo pela vida e instintos; sentido de organismo.
· Conceituação de Weber: ‘agir em comunidade’ significa todas as vezes que a ação humana se refere de maneira subjetivamente provida de sentido ao comportamento de outros homens. Já ‘agir em sociedade’ um agir em comunidade na medida em que: 1) se orienta, de maneira significativa, por expectativas que são alimentadas com base em regulamentações; 2) na medida em que tal regulamentação foi feita de modo puramente racional com relação a fins, tendo em mente o agir esperado dos associados como conseqüência e 3) quando a orientação provida de sentido se faz, subjetivamente, de maneira racional com relação a fins"
· Para ocorrer uma associação política, na perspectiva weberiana, são necessárias: (1) uma delimitação territorial; (2) a existência, neste território, de um quadro gerencial e executor exclusivo, excludente e inconteste; e (3) a execução, por este quadro gerencial, da administração, da lei e da violência necessárias para manter a ordem estatuída e sua preservação como tal, enquanto integridade do território e jurisdição sobre ele.

4 - Sociedade e Estado
· Tema livre para debate em sala, com conceituação individual e coletiva.
· Para o anarquismo, a sociedade é a expressão da liberdade difusa e o Estado é a opressão organizada.
· Para o marxismo, o estado é produto da sociedade, instrumento das contradições sociais e dos antagonismo de classes. O Estado estaria dentro da Sociedade e não fora.
· Para Bobbio, a sociedade é o conjunto de relações humanas intersubjetivas, anteriores, exteriores e contrárias ao estado ou sujeitas a este.

5 - Conceito de Estado
· Acepção Filosófica: valor social mais alto, uma realidade de idéia moral, manifestação visível da divindade para Hegel, conciliando (síntese) a contradição entre Família (tese) e Sociedade (antítese), dentro de uma visão dialética.
· Acepção Jurídica: para Kant, seria a reunião de um agrupamento de homens vivendo sob leis do Direito. Para Del Vecchio, seria o sujeito da ordem jurídica na qual se realiza a comunidade de vida de um povo ou a expressão potestativa da sociedade.
· Acepção Sociológica: para Oppenheimer, seria a instituição social, que um grupo vitorioso impôs a um grupo vencido, com o único fim de organizar o domínio do primeiro sobre o segundo e resguardar-se contra rebeliões intestinas e agressões estrangeiras. Para Jhering, o Estado seria a organização social do poder de coerção. Ou a sociedade como titular de um poder coercitivo regulado e disciplinado, representando o Direito a disciplina da coerção. Segundo Marx, é o poder organizado de uma classe para opressão de outra.
· Estado para Weber: entendido como uma associação política institucionalizada e especializada de dominação. Para Max Weber, o Estado é aquela comunidade humana que no interior de um determinado território - o conceito de ‘território’ é essencial à definição - reclama para si (com êxito) o monopólio da coação física legítima. Porque é específico da atualidade que às demais associações ou pessoas individuais somente se concede o direito da coação física na medida em que o Estado o permite. Considera-se este, pois, como fonte única do ‘direito’ de coação” (Max Weber, in Sociologia do Estado). Sociologicamente, o Estado moderno só pode definir-se em última instância a partir de um meio específico que, do mesmo modo que a toda associação política, lhe é próprio, a saber: o da coação física. ‘Todo Estado se baseia na força’, disse um dia Trotsky em Brest-Litowsk

6 - Elementos Constitutivos do Estado
· Ordem formal: poder político da sociedade.
· Ordem material: elemento humano (povo, população, nação e território)
· A cidadania pode ser considerada como elemento do Estado?

Os elementos do Estado serão minuciosamente estudados na próxima aula.

7 - Frases para Reflexão
· “coexistem, em todos os sistemas sociais, sistemas de interesses que tratam de orientar e delimitar a ação do Estado, e uma autonomia mais ou menos significativa do Estado que trata de influenciar a vida da sociedade civil” (Schwartzman).
· "Por Estado deve-se entender um instituto político, de atividade contínua, quando e na medida em que seu quadro administrativo mantenha, com êxito, a pretensão ao monopólio legítimo da coação física, para a manutenção da ordem vigente". Assim, "diz-se que uma ação é politicamente orientada, quando e na medida em que tende a influir na direção de uma associação política, particularmente na apropriação ou expropriação, na nova distribuição ou atribuição dos poderes governamentais" (Weber)

8 - O Papel do Estado

Cada Estado particular é visto, na aurora da civilização contemporânea, como uma associação política particular em concorrência com as demais pela aquisição e acumulação do capital - este por sua vez não fixado a residência alguma - que lhe possibilitaria as condições materiais necessárias à aquisição do poder. Foi, pois, “da coalizão necessária do Estado nacional com o capital surgiu a classe burguesa nacional, a burguesia no sentido moderno do vocábulo”[1]

Os pilares do Estado Social de Direito datam do período entre os anos vinte e trinta, caracterizados por uma turbulência totalitária da Europa, quando há uma avalanche de transformações com o deslocamento da primazia do setor primário de produção, ou seja, a agricultura para o setor industriário; da família patriarcal, tradicional e eminentemente conservadora para a família nuclear, onde impera o individualismo e a escassez de padrões previamente estabelecidos, etc.

Consequentemente, tais fenômenos iriam repercutir não só a nível econômico e social, mas também a nível individual, ocasionando uma série de desequilíbrios ao homem. Sabe-se que nos períodos concernentes à Renascença, ao Iluminismo e Romantismo, o homem vivia um estado letárgico, quando acreditava-se em uma possibilidade de uma melhoria objetiva, na verdade, tratava-se de uma utopia da certeza de um mundo melhor.

Porém, neste período de transformações a que nos referimos, quando vigora a crise da Democracia e a impopularidade do Estado de Direito, cuja característica precípua era ser um estado estático, com normas obsoletas, não adequadas às transformações econômicas e sociais, o homem percebe a dura realidade em que vive e a necessidade de uma urgente adequação deste Estado de Direito às novas transformações, ou seja das normas às cada vez mais latentes, alterações econômicas e necessidades sociais. Não há que se falar em renúncia do Estado de Direito, sendo indiscutível o valor do mesmo, urge dar-lhe um conteúdo econômico e social, realizando dentro de seus quadros, uma nova ordem de trabalho e de distribuição de bens.

Institucionalizou-se a idéia de Estado Social na Constituição da República Federal da Alemanha de 1949 como resposta e proposta histórica ao processo de desenvolvimento tecnológico (período pós guerra) que poderia ser estendido a todos os componentes do país.

Genericamente, o Estado Social significa a adaptação do Estado tradicional (Liberal Burguês) às condições econômicas e sociais da civilização industrial e pós industrial, período este caracterizado pelas grandes possibilidades técnicas, econômicas e sociais, mas também pelos seus novos e complexos problemas.

Em termos econômicos, a partir de 1936 Keynes promove a conexão entre Estado e sociedade civil: o Estado não adquire a propriedade dos meios de produção, porém toma para si a tarefa de orientar e controlar o sistema econômico sendo que tal política deixa clara a preocupação de se racionalizar os impactos de uma modificação contínua dos meios de produção e dos critérios de redistribuição de rendas. Ressalte-se o grande passo em se tratando da relação Estado X Economia; na era Fisiocrata a economia deveria ser analisada como a terra, tudo nascia, crescia e se produzia por si só, o Estado não interferia em absolutamente nada, no Estado Contemporâneo, a economia deve ser direcionada, enfim conduzida pelo Estado visando o bem estar social.

Tal tentativa de adaptação do Estado de Direito às constantes transformações decorrentes das novas condições sociais da civilização industrial e pós industrial visa também a sobrevivência do Estado nos tempos modernos. Sabe-se que o Estado está submetido a constantes pressões, a crises políticas permanentes, gerando crises sociais gigantescas, sendo que a história nos mostra que tais situações geralmente foram abafadas mediante a imposição de formas estatais totalitárias acarretando a supressão da liberdade, a violência constante, o império do terror, a política externa agressiva.

Desta forma, se o Estado como instituição desejasse subsistir-se deveria primeiramente empenhar-se em controlar de modo permanente, os aspectos econômicos, sociais e culturais da sociedade. Em relação ao Estado Democrático de Direito, a sobrevivência do mesmo depende, além das adequações acima citadas, do acréscimo aos seus objetivos, da regulamentação permanente do sistema social, ou seja, da constante adaptação das normas às mudanças sociais visando a primazia do coletivo (promoção pelo estado do bem estar social).

Estado e sociedade podem ser entendidos como dois sistemas fortemente inter-relacionados entre si através de relações complexas, fazendo parte de um macro-sistema que embora não limite a respectiva autonomia, os submete a fins específicos, sendo que ambos operam para a coexistência pacífica e sobrevivência de ambas as instituições.

Os valores intrínsecos do Estado Liberal Democrático como a liberdade, a propriedade individual, as garantias jurídicas e a igualdade formal ou potencial são submetidos ao patrimônio coletivo*.

Ricardo Campa, in O Estado Contemporâneo, unidade IV: Relação Estado/Sociedade. A crise atual do Estado. A justiça comutativa é substituída pela justiça distributiva, o Estado legislador é substituído pelo Estado gestor, o Estado estático contrapõe-se o Estado das prestações sociais.

A nível social há uma transferência do espaço vital dominado, ou seja, aquele em que o indivíduo pode controlar, exercer o seu domínio, onde predomina o individualismo para o espaço vital efetivo, que é aquele em que o indivíduo utiliza, mas não exerce o seu domínio, onde predomina o coletivo. Há então, uma gradual transferência do espaço vital dominado (podemos visualizá-lo como sendo a residência do indivíduo) para o espaço vital coletivo (representado pelos serviços públicos). Sabe-se que causa primária de instabilidade social é a limitação da possibilidade do homem de exercer a sua necessidade de dominar o seu território.

Importante ressaltar um traço distintivo do Estado Contemporâneo: a empresarialidade. No estado contemporâneo, o estado participa com um capital privado em empresas mistas e promove a estatização das empresas. É também característica precípua do estado contemporâneo a primazia da função social da propriedade. A propriedade perde gradualmente o seu significado de direito adquirido e passa a se destinar ao bem estar social. A propriedade do bem é limitada pela função social do mesmo. O direito de proprietário é limitado pela função social da propriedade. Verificar novamente a presença no estado contemporâneo da primazia do coletivo sobre o individual. Os direitos individuais são limitados em prol da sociedade.

O estado contemporâneo tem função eminentemente social, é o Estado das Prestações. O estado tem como função precípua zelar pelo bem estar social, para tanto destina parte do produto nacional bruto para tal. Na função social do estado, inclui-se também a prestação de serviços que o cidadão como indivíduo pode não considerar como sendo prioritários, como a defesa nacional, porém, ao zelar pelo bem estar social, cabe ao estado zelar pela segurança nacional do território.

Acredita-se que tal função social do estado contemporâneo contribui para a redistribuição de renda decorrente da implantação e o funcionamento de serviços públicos mediante organizações complexas que confiam a eficiência de tais serviços à responsabilidade coletiva, visando a confiança no bem público, na propriedade de todos e de ninguém.

O direito social decorrente da adaptação do Estado Democrático de Direito em um Estado Social implica a limitação jurídica de determinados direitos individuais. O Estado Social desencadeia um processo de integração de vários grupos nacionais.

- TEXTO PARA ANÁLISE E REFLEXÃO

MARX E O ESTADO
André Guimarães Augusto - Prof º do Departamento de Economia da Universidade Federal Fluminense
Doutorando do Instituto de Economia – UFRJ

O objetivo dessa comunicação é expor a visão marxiana (ou marxista) acerca da natureza do Estado capitalista e de suas transformações. Como é sabido, não há uma obra específica de Marx que se atenha a esse tema. As análises marxianas sobre o Estado estão dispersas em diversos textos ao longo de toda sua obra.

A tese que procuraremos defender é de que nas polêmicas dos anos iniciais o Estado já é apreendido por Marx como um resultado da luta de classes, ainda que essa visão apareça de uma forma mais explícita e elaborada somente nos textos finais desse período. Nos textos seguintes sobre a conjuntura política, aparece de forma mais concreta a determinação do Estado pela luta de classes, o Estado como produto e condição da luta de classes.

Uma primeira série de observações sobre o tema do Estado se encontra nos textos iniciais de Marx, abrangendo um período que vai da "Crítica da Filosofia do Direito de Hegel" em 1842 até o "Manifesto Comunista" de 1848, passando pela "Questão Judaica" e pela "Ideologia Alemã". O caráter destes textos é essencialmente polêmico, dirigido contra a filosofia de Hegel e seus herdeiros. De início Marx refuta a suposta identidade entre Estado e sociedade civil contida na filosofia hegeliana, procurando assinalar a oposição entre a esfera política e a vida civil no mundo moderno. Na "Crítica da Filosofia do Direito de Hegel" Marx observa que a oposição entre Estado e Sociedade Civil pressupõe a propriedade privada. O significado e a raiz dessa oposição devem ser buscados na relação entre Estado e propriedade privada.

As relações entre o Estado moderno e a propriedade privada serão desenvolvidas por Marx nas obras posteriores. Em "A Questão Judaica", Marx observa que a o processo

de emancipação política torna o Estado moderno uma comunidade política constituída por cidadãos iguais. A emancipação política porém coincide com a emancipação da propriedade privada. Marx aponta o caráter apenas formal da determinação do Estado como comunidade política, constituindo a propriedade privada universal seu conteúdo. A finalidade do Estado é garantir o interesse comum, mas este é concebido como o conjunto dos interesses dos indivíduos proprietários. Assim, o Estado é caracterizado por Marx nessa obra como "comunidade ilusória".

A partir de "A Ideologia Alemã" a concepção marxiana do Estado parece já estar desenvolvida em seus contornos essenciais. Um resumo dessa concepção, nesse ponto da obra de Marx, nos revela o Estado como uma das formas em que se desenvolve a contradição entre propriedade e trabalho e portanto, uma das formas em que se desenvolve a luta de classes. Se por um lado o Estado exerce funções sociais gerais, se aparece como representante do interesse comum, por outro, só se apresenta assim na medida em que faz valer os interesses comuns de uma classe. O Estado se constitui como uma dupla determinação: exerce funções sociais gerais - resultante da divisão do trabalho - mas as exerce sob uma forma despótica, autoritária, sob a forma do domínio de uma classe sobre outra; em resumo sob a forma de Estado.

O vínculo do Estado com as classes sociais reconhecido nos primeiros trabalhos, é retomado e desenvolvido sob um novo angulo na série de trabalhos seguintes em que Marx analisa a situação da conjuntura política na França ("A guerra civil na França", "O dezoito de Brumário de Luís Bonaparte") e na Alemanha ("A Burguesia e a Contra-Revolução", série de artigos publicada na Nova Gazeta Renana ). Nesses trabalhos o Estado é captado de um ponto de vista dinâmico, em suas transformações, contradições, articulações com outras esferas sociais e diferenças concretas.

É preciso lembrara que Marx destaca, especialmente na análise do caso francês, o papel das frações de classe e da composição do bloco do poder na determinação das ações e da forma do Estado. Além disso, recoloca-se a contradição entre forma e conteúdo do Estado. As diferentes formas de governo são apreendidas como diferentes formas em que se desenvolve a luta de classes; se todo Estado moderno tem como conteúdo a dominação burguesa sua forma não está totalmente pré-determinada.

Segundo a tese que defendemos, essas obras revelam que Marx compreendia o desenvolvimento do Estado e suas mudanças como sendo referenciados às transformações sociais. Tal concepção, pode ser apresentada resumidamente da seguinte forma: em cada período a luta de classes entre capital e trabalho se dá sob uma base herdada do período anterior, o que inclui a forma do Estado; a luta de classes irá atuar sobre essa herança, acentuando algumas características, enfraquecendo ou eliminando outras, enfrentando maior ou menor resistência do organismo estatal. O Estado na sua forma determinada em um dado momento é apreendido por Marx como produto das lutas anteriores, e nesse sentido é uma condição da luta de classes; mas essa se caracteriza pela própria mudança de suas condições. Desta forma, o Estado também é objeto das lutas atuais, sendo modificado por elas.

A interpretação defendida nesse trabalho acerca da concepção marxiana do Estado enfrenta uma série de polêmicas. Primeiramente indicamos uma continuidade na obra de Marx, entre as obras iniciais e as posteriores que vai contra a leitura althusseriana de uma ruptura entre o "jovem Marx" filósofo e um "Marx maduro", autor de uma "ciência da história".

Em segundo lugar, a interpretação acerca da natureza de classe do Estado tem sido objeto de intensa polêmica entre os marxistas. Segundo a interpretação denominada de instrumentalista o Estado seria um "comitê para gerir negócios da burguesia", estando sob seu controle direto (Milliband). Já a versão estruturalista aponta os constrangimentos estruturais à ação do Estado como determinante de sua natureza de classe; segundo essa versão o Estado não é um simples instrumento nas mãos da burguesia, mas goza de autonomia relativa (Poulantzas). Uma terceira interpretação – que se identifica com a leitura dos textos de Marx defendida nesse trabalho - apreende o Estado como uma das formas da luta de classes na sociedade capitalista (Holloway).




UNIVERSIDADE DE RIBEIRÃO PRETO (UNAERP)
TEORIA DO ESTADO I - PROF. ANTONIO CALIXTO
1ª semestre 2004

DO ESTADO - Sociedade e Estado: Conceito de Sociedade. Relação entre Sociedade e Estado. Conceitos de Estado: (a) prisma filosófico, (b) prisma sociológico e (c) prisma jurídico. Introdução aos Elementos Constitutivos do Estado.

1 - Conceito de Sociedade - Por quê um termo abstrato e impreciso?
· Para Talcott Persons, seria "todo o complexo de relações do homem com seus semelhantes".
· Para Toennies, sob uma ótica mecanicista, seria "um grupo derivado de um acordo de vontades, de membros que buscam, mediante o vínculo associativo, um interesse comum, impossível de obter-se pelos esforços isolados dos indivíduos".
· Para Giorgio Del Vecchio, sob uma ótica organicista, seria "o conjunto de relações mediante as quais vários indivíduos vivem e atuam solidariamente em ordem a formar uma entidade nova e superior".

2 - As Teorias Organicistas e Mecanicistas da Sociedade
· Na concepção Aristotélica, o homem seria um "ser social", ou como diria Hugo Grotius, possuiria um "appetitus societatis". Por quê? Esta é uma posição organicista?
· Definição de organicismo para Del Vecchio: "reunião de várias partes, que preenchem funções distintas e que, por sua ação combinada, concorrem para manter a vida do todo".
· Organicismo: Supremacia da Sociedade sobre o Indivíduo. Mecanicismo: relativa autonomia do indivíduo dentro do "todo" formado.
· Podemos fazer analogias entre autoritarismo e liberalismo versus organicismo e mecanicismo?

3- Sociedade, Comunidade e Associação Política
· Para Toennies, Sociedade supõe a ação conjunta e racional dos indivíduos no seio da ordem jurídica e econômica, aonde, a despeito de todos os laços, os indivíduos permanecem separados. Comunidade implicaria na existência de formas de vida e organização social, onde impere essencialmente uma solidariedade feita de vínculos psíquicos.
· Sociedade: vontade arbitrária, organização, governo pela razão, simbolismo formal e ordenador.
· Comunidade: vontade essencial, substancial e orgânica; solidariedade mecânica; governo pela vida e instintos; sentido de organismo.
· Conceituação de Weber: ‘agir em comunidade’ significa todas as vezes que a ação humana se refere de maneira subjetivamente provida de sentido ao comportamento de outros homens. Já ‘agir em sociedade’ um agir em comunidade na medida em que: 1) se orienta, de maneira significativa, por expectativas que são alimentadas com base em regulamentações; 2) na medida em que tal regulamentação foi feita de modo puramente racional com relação a fins, tendo em mente o agir esperado dos associados como conseqüência e 3) quando a orientação provida de sentido se faz, subjetivamente, de maneira racional com relação a fins"
· Para ocorrer uma associação política, na perspectiva weberiana, são necessárias: (1) uma delimitação territorial; (2) a existência, neste território, de um quadro gerencial e executor exclusivo, excludente e inconteste; e (3) a execução, por este quadro gerencial, da administração, da lei e da violência necessárias para manter a ordem estatuída e sua preservação como tal, enquanto integridade do território e jurisdição sobre ele.

4 - Sociedade e Estado
· Tema livre para debate em sala, com conceituação individual e coletiva.
· Para o anarquismo, a sociedade é a expressão da liberdade difusa e o Estado é a opressão organizada.
· Para o marxismo, o estado é produto da sociedade, instrumento das contradições sociais e dos antagonismo de classes. O Estado estaria dentro da Sociedade e não fora.
· Para Bobbio, a sociedade é o conjunto de relações humanas intersubjetivas, anteriores, exteriores e contrárias ao estado ou sujeitas a este.

5 - Conceito de Estado
· Acepção Filosófica: valor social mais alto, uma realidade de idéia moral, manifestação visível da divindade para Hegel, conciliando (síntese) a contradição entre Família (tese) e Sociedade (antítese), dentro de uma visão dialética.
· Acepção Jurídica: para Kant, seria a reunião de um agrupamento de homens vivendo sob leis do Direito. Para Del Vecchio, seria o sujeito da ordem jurídica na qual se realiza a comunidade de vida de um povo ou a expressão potestativa da sociedade.
· Acepção Sociológica: para Oppenheimer, seria a instituição social, que um grupo vitorioso impôs a um grupo vencido, com o único fim de organizar o domínio do primeiro sobre o segundo e resguardar-se contra rebeliões intestinas e agressões estrangeiras. Para Jhering, o Estado seria a organização social do poder de coerção. Ou a sociedade como titular de um poder coercitivo regulado e disciplinado, representando o Direito a disciplina da coerção. Segundo Marx, é o poder organizado de uma classe para opressão de outra.
· Estado para Weber: entendido como uma associação política institucionalizada e especializada de dominação. Para Max Weber, o Estado é aquela comunidade humana que no interior de um determinado território - o conceito de ‘território’ é essencial à definição - reclama para si (com êxito) o monopólio da coação física legítima. Porque é específico da atualidade que às demais associações ou pessoas individuais somente se concede o direito da coação física na medida em que o Estado o permite. Considera-se este, pois, como fonte única do ‘direito’ de coação” (Max Weber, in Sociologia do Estado). Sociologicamente, o Estado moderno só pode definir-se em última instância a partir de um meio específico que, do mesmo modo que a toda associação política, lhe é próprio, a saber: o da coação física. ‘Todo Estado se baseia na força’, disse um dia Trotsky em Brest-Litowsk

6 - Elementos Constitutivos do Estado
· Ordem formal: poder político da sociedade.
· Ordem material: elemento humano (povo, população, nação e território)
· A cidadania pode ser considerada como elemento do Estado?

Os elementos do Estado serão minuciosamente estudados na próxima aula.

7 - Frases para Reflexão
· “coexistem, em todos os sistemas sociais, sistemas de interesses que tratam de orientar e delimitar a ação do Estado, e uma autonomia mais ou menos significativa do Estado que trata de influenciar a vida da sociedade civil” (Schwartzman).
· "Por Estado deve-se entender um instituto político, de atividade contínua, quando e na medida em que seu quadro administrativo mantenha, com êxito, a pretensão ao monopólio legítimo da coação física, para a manutenção da ordem vigente". Assim, "diz-se que uma ação é politicamente orientada, quando e na medida em que tende a influir na direção de uma associação política, particularmente na apropriação ou expropriação, na nova distribuição ou atribuição dos poderes governamentais" (Weber)

8 - O Papel do Estado

Cada Estado particular é visto, na aurora da civilização contemporânea, como uma associação política particular em concorrência com as demais pela aquisição e acumulação do capital - este por sua vez não fixado a residência alguma - que lhe possibilitaria as condições materiais necessárias à aquisição do poder. Foi, pois, “da coalizão necessária do Estado nacional com o capital surgiu a classe burguesa nacional, a burguesia no sentido moderno do vocábulo”[2]

Os pilares do Estado Social de Direito datam do período entre os anos vinte e trinta, caracterizados por uma turbulência totalitária da Europa, quando há uma avalanche de transformações com o deslocamento da primazia do setor primário de produção, ou seja, a agricultura para o setor industriário; da família patriarcal, tradicional e eminentemente conservadora para a família nuclear, onde impera o individualismo e a escassez de padrões previamente estabelecidos, etc.

Consequentemente, tais fenômenos iriam repercutir não só a nível econômico e social, mas também a nível individual, ocasionando uma série de desequilíbrios ao homem. Sabe-se que nos períodos concernentes à Renascença, ao Iluminismo e Romantismo, o homem vivia um estado letárgico, quando acreditava-se em uma possibilidade de uma melhoria objetiva, na verdade, tratava-se de uma utopia da certeza de um mundo melhor.

Porém, neste período de transformações a que nos referimos, quando vigora a crise da Democracia e a impopularidade do Estado de Direito, cuja característica precípua era ser um estado estático, com normas obsoletas, não adequadas às transformações econômicas e sociais, o homem percebe a dura realidade em que vive e a necessidade de uma urgente adequação deste Estado de Direito às novas transformações, ou seja das normas às cada vez mais latentes, alterações econômicas e necessidades sociais. Não há que se falar em renúncia do Estado de Direito, sendo indiscutível o valor do mesmo, urge dar-lhe um conteúdo econômico e social, realizando dentro de seus quadros, uma nova ordem de trabalho e de distribuição de bens.

Institucionalizou-se a idéia de Estado Social na Constituição da República Federal da Alemanha de 1949 como resposta e proposta histórica ao processo de desenvolvimento tecnológico (período pós guerra) que poderia ser estendido a todos os componentes do país.

Genericamente, o Estado Social significa a adaptação do Estado tradicional (Liberal Burguês) às condições econômicas e sociais da civilização industrial e pós industrial, período este caracterizado pelas grandes possibilidades técnicas, econômicas e sociais, mas também pelos seus novos e complexos problemas.

Em termos econômicos, a partir de 1936 Keynes promove a conexão entre Estado e sociedade civil: o Estado não adquire a propriedade dos meios de produção, porém toma para si a tarefa de orientar e controlar o sistema econômico sendo que tal política deixa clara a preocupação de se racionalizar os impactos de uma modificação contínua dos meios de produção e dos critérios de redistribuição de rendas. Ressalte-se o grande passo em se tratando da relação Estado X Economia; na era Fisiocrata a economia deveria ser analisada como a terra, tudo nascia, crescia e se produzia por si só, o Estado não interferia em absolutamente nada, no Estado Contemporâneo, a economia deve ser direcionada, enfim conduzida pelo Estado visando o bem estar social.

Tal tentativa de adaptação do Estado de Direito às constantes transformações decorrentes das novas condições sociais da civilização industrial e pós industrial visa também a sobrevivência do Estado nos tempos modernos. Sabe-se que o Estado está submetido a constantes pressões, a crises políticas permanentes, gerando crises sociais gigantescas, sendo que a história nos mostra que tais situações geralmente foram abafadas mediante a imposição de formas estatais totalitárias acarretando a supressão da liberdade, a violência constante, o império do terror, a política externa agressiva.


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