segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

TEXTO DE LINGUISTICA DENOMINADO: EU ENTENDI

EU ENTENDI
Rubens Dias Maia*
Mestre em Linguística pela UFSCAR e Docente do Departamento de Letras e Direito da Unaerp (Universidade de Ribeirão Preto)
RESUMO: Este artigo pretende refletir sobre um tema fundamental em estudos lingüísticos, o signo, instrumento para comunicação e para o saber. Depois de muito ouvir o enunciado “eu entendi”, o filósofo da linguagem procura desvendar o mistério que se encontra nessa expressão. “O que alguém entende quando ouve que o outro entendeu?” O signo guarda esse mistério, o que é entender? No signo se constrói toda atividade lingüística.
PALAVRAS-CHAVE: sinal, signo, diálogo, entendimento, persuasão.

Para introdução nada melhor que o pensamento de dois lingüistas, Hjelmslev e Charaudeau.
“A linguagem é o instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus sentimentos, seus esforços, sua vontade e seus atos, o instrumento graças ao qual ele influencia e é influenciado, a base última e mais profunda da sociedade humana”. Essa é uma das primeiras afirmações de Hjelmslev ao começar os Prolegômenos a uma Teoria da Linguagem (Pens. 1975, p.185). A esse pensamento do lingüista dinamarquês, podemos acrescentar o que disse Charaudeau no prefácio de Linguagem e Discurso (2008): “É também a linguagem que permite ao homem viver em sociedade”.
Na afirmação desses dois lingüistas, encontramos certos termos e conceitos para uma reflexão. Ao mencionarem vida social, influência mútua, linguagem e entendimento, apresentam elementos que caracterizam o relacionamento humano. A linguagem realiza-se eminentemente pelo diálogo para comunicação e entendimento entre as pessoas. Ele é, pois, a manifestação de linguagem e condição de vida social, onde acontecem as influências mútuas. O diálogo é aquilo a que chamamos comumente de conversa, atividade que constitui o convívio humano. “A conversação é a primeira das formas de linguagem a que estamos expostos e provavelmente a única da qual nunca abdicamos pela vida afora” (Marcuschi, 1986, p.14). No diálogo, a pessoa dá opiniões, afirma, faz perguntas, responde e pode manifestar seus sentimentos. Há diálogo de mero entretenimento e há diálogo para debate de idéias, o diálogo que pretende produzir persuasão ou convicção. O diálogo argumentativo é instrumento do educador.
“Eu entendi” é a afirmação que muitas vezes se ouve num diálogo, como resposta a quem, depois de alguma informação para o interlocutor, pergunta: “você entendeu?”. O diálogo ou a conversação é assim a forma mais comum do relacionamento humano, quando as pessoas pretendem comunicar todo seu mundo interior, emoções, desejos e pensamentos. O diálogo é um ato de fala, ou discurso. Nas atividades de fala ou discurso, a pessoa realiza a faculdade de linguagem por meio de um instrumento comum para comunicação e entendimento, a saber, a língua. Individualmente, todos nós temos pela natureza essa capacidade de linguagem, mas recebemos do exterior, do convívio na comunidade, a língua. A língua, entendida aqui num sentido bem amplo, é uma atualização da linguagem e a condição necessária para a fala. Língua e linguagem, no entanto, só reconhecemos nos exercícios ou atos de fala. Percebemos então no diálogo um ato de fala, que manifesta a linguagem pelo sistema da língua. O diálogo, palavra comum do nosso cotidiano, já foi, porém, na Antiguidade clássica, um método de estudo e pesquisa. Esse termo tem a mesma origem etimológica de dialética.
A dialética era um método socrático de ensino usado pelo diálogo, perguntas e respostas. O método dialético de Sócrates tinha principalmente finalidades educativas e éticas, mas procurava também o ensino lógico e racional. Diríamos que havia também finalidade pedagógica, um diálogo que formava conceitos e opiniões. Em Platão, entretanto, a dialética, além desse sentido socrático, de arte do diálogo ou conversação, era também a ciência perfeita, aquela que liberta as pessoas dos conhecimentos falsos e ilusórios, e tornou-se um gênero literário. Platão não escrevia sistematicamente sobre seus temas, imitava a técnica de Sócrates de perguntas e respostas para levar o ouvinte, ou leitor, a encontrar a resposta para suas dúvidas. Platão inventou esse gênero literário, seguido depois por muitos outros autores. Conforme dizem entendidos, de Platão nos chegaram trinta e cinco diálogos e um conjunto de outros escritos.
Em Sócrates e em Platão, portanto, notamos a conversação ou diálogo como método de ensino e aprendizado. Além de discussão de idéias, era método pedagógico através da fala dialogada, perguntas e afirmações. O diálogo manifesta opiniões e sentimentos, produz convicção e sentido no íntimo das pessoas, os parceiros da comunicação.
O sentido é sempre um fenômeno do mundo interior, ou da consciência e manifestado pela linguagem. Só existe linguagem como atividade semiótica porque o sentido se forma no íntimo das pessoas. O mundo interior se organiza no pensamento, adquire sentido, manifesta-se pela linguagem e produz interação social. A convicção é sempre um fenômeno no interior da consciência.
Percebemos aí alguns conceitos: linguagem, pensamento, sentido e a influência mútua, conceitos fundamentais que podem orientar uma reflexão sobre relacionamento humano. Como a linguagem pode produzir sentidos e influenciar as pessoas no convívio social? Voltando a Sócrates, sabemos que ele tinha preocupações em descobrir a verdadeira definição ou conceito exato das coisas. Provocava seus interlocutores com a pergunta “o que é? Sócrates não elaborou uma lógica como Aristóteles, mas mostrava preocupação com o rigor lógico, queria clareza e precisão nas idéias. Para Sócrates, conhecimento, ciência são fatores de virtude. A educação do comportamento começa pela educação do intelecto. Ninguém comete o mal voluntariamente, mas por ignorância. A virtude está ligada ao conhecimento, e o vício é conseqüência da ignorância. Sua pedagogia começa pelo conhecimento como condição para praticar o bem e evitar o mal. Mesmo não aceitando simplesmente ou sem nenhuma ressalva as teses socráticas sobre educação, devemos concordar com a importância do aprimoramento intelectual pela formação de conceitos precisos e exatos.
Por isso devemos definir bem esses termos que a atividade da linguagem nos propõe, sentido, pensamento, e influência. São conceitos e termos de uso comum e intuitivo, que se apresentam espontaneamente na vida diária. Todos sabem o que é sentido, pensamento, linguagem, influência, mas esses termos podem oferecer ambigüidades. São, de fato, usados de maneira vaga e imprecisa na linguagem diária, e definidos de modo diferente até entre os autores. 

Vejamos, por exemplo, a palavra “sentido”.
Ducrot, numa nota de rodapé (1987, p. 31) afirma: “A frase é uma entidade gramatical abstrata, e o enunciado é uma realização particular da frase. O sentido é o valor semântico do enunciado, a significação, o valor semântico da frase.” Distingue Ducrot sentido e significação, e nos leva a concluir que devemos procurar o sentido, isto é, o exato valor semântico das palavras num contexto de realização. Conforme boa orientação de Ullmann (1973, p.118), orientação que não deixa de ser socrática também, é preciso fixar e definir a terminologia: “Antes de prosseguir, será necessário adaptar a terminologia à tarefa que temos em mãos”.E, na página seguinte, comentando o triângulo de Ogden e Richards, e querendo evitar termos técnicos, diz:
“... pareceu-me mais oportuno usar palavras simples, da linguagem do dia-a-dia, dando-lhes um pouco mais de rigor do que tem no emprego vulgar. Os três termos que sugeriria são: “nome”, “sentido”, e “coisa”. O “nome” é a configuração fonética da palavra, os sons que a constituem e também outros aspectos fonéticos, tais como o acento. O “sentido”, expresso em termos gerais, sem nos fecharmos em nenhuma doutrina psicológica particular, é a “informação que o nome comunica ao ouvinte”, enquanto que a “coisa” é o referente de Ogden e Richards, o aspecto ou acontecimento não - lingüístico acerca do qual falamos.”
Podemos, por enquanto, ficar com essa definição de sentido: a ”informação que o nome comunica ao ouvinte”. Então em nossa linguagem usamos nomes, palavras, para designar as coisas, seres da realidade ou da ficção e produzimos sentido, que é a informação ou conceito para o pensamento. Peirce chamará de interpretante esse signo criado na mente de uma pessoa, uma significação mais apurada ou o sentido de uma palavra que alguém entende.
Num diálogo, portanto, trocam-se informações e realiza-se o sentido. O sentido, por sua vez, está no pensamento e na linguagem, ele não pode ser uma entidade autônoma, independente da pessoa que pensa. O sentido realiza-se no pensamento pela linguagem. Por isso, o diálogo: “Você entendeu? Entendi” , é uma atividade expressa pela sonoridade das palavras com um elemento interno, o conteúdo mental, o interpretante de Peirce, que deve ter um referente, alguma coisa, real ou fictícia.
Podemos analisar melhor a palavra sentido. As palavras têm sua história, o vocabulário de uma língua teve sua origem, sua evolução. Uma palavra surge, pode permanecer, alterar-se, desaparecer. O vocábulo ou a palavra “sentido” prende-se, pela etimologia, ao verbo latino “sentire”, com as variações morfológicas: sentio, sentis, sentire, sensi, sensum, que servem de radicais para novas palavras. Sentir é propriamente experimentar uma sensação, ou perceber pelos sentidos externos, vista, ouvido, tato. Num sentido mais lato, figurado, sentir pode também significar “perceber internamente pela inteligência”. A palavra “sentença” derivada do latim “sententia”, com a mesma origem de “sentir”, dá idéia de uma maneira de ver, de perceber, opinar e julgar com base na percepção física e moral. Por isso, exarar uma sentença, declarar uma opinião. De modo análogo, senso é a capacidade de entender ou interpretar as impressões físicas e intelectuais. O “sentido”, por conseguinte, passa a designar percepção, conhecimento e “sentido” confunde-se com “entendimento”. Da mesma família etimológica, temos Senso comum, que é termo de filosofia e caracteriza o modo de pensar da maioria das pessoas, às vezes, chamado bom senso. O senso comum compreende os princípios gerais do pensamento, as certezas fundamentais da razão humana. A primeira frase de Descartes, no Discours de la méthode, é :”Le Bon Sens est la chose du monde la mieux partagée...” (1996, p.45) , querendo dizer que o senso comum ou bom senso é uma qualidade que se encontra em todo ser humano. Podemos concluir que o sentido nasce, pois, primeiramente da percepção sensorial das coisas existentes no mundo. O sentido resulta do sentir ou perceber as coisas do mundo. Sentimos e conhecemos, ficamos sabendo que alguma coisa existe. Em seguida, pela memória, imaginação, nasce um sentido interior, uma imagem interna, uma figura concreta, a mesma figura que vemos com os sentidos externos reproduzimos internamente. Depois, por uma outra elaboração mental, surge a idéia ou conceito universal.
A palavra sentido, às vezes, se aproxima da idéia de organização, de ordem. Ter sentido, fazer sentido, ter ordem. Ordem nas coisas, ordem no pensamento, tudo está em alinhamento, há ornamento. O sentido, nesse caso, está em oposição à desordem e ao caos no pensamento e nas coisas. O sentido, por outro lado, como percepção mental, procura e dá identidade às coisas, por isso, paradoxalmente, até a desordem tem sentido no mundo das idéias. Muitas vezes dizemos: “isto está confuso ou não tem sentido”, há aí um conteúdo mental, mesmo que não haja sentido “de um ponto de vista qualquer”, como dirá Hjelmslev (1975, p.204)
1. O conhecimento e a linguagem
O sentido está relacionado com o conhecimento e a linguagem, não pode haver sentido fora da linguagem e do conhecimento. Podemos ainda volta na distinção de Ducrot, feita acima, entre sentido e significação. O sentido sempre acontece numa enunciação singular, num ato de fala realizado por alguém e para alguém. Podemos, porém, pensar numa significação ou num significado mais ou menos teórico e abstrato, fora do contexto da enunciação, por exemplo, a palavra num dicionário. Sentido virtual.
2. Significado, sentido, caos, ordem
Hesíodo, no poema Teogonia, inicia dizendo: ”Primeiro que tudo surgiu o Caos...” A Teogonia de Hesíodo, pela sugestão do nome, quer narrar a genealogia dos deuses, mas como muitos desses deuses são forças da natureza personificadas, o poema, de fato, trata da origem e organização do mundo. Na Bíblia ou Escrituras Sagradas, lemos também um relato sobre as origens do mundo, que nos faz pensar nesse caos primordial: “No princípio, Deus criou o céu e a terra. Ora, a terra estava vazia e vaga, as trevas cobriam o abismo...”
Todo esse universo, no poema de Hesíodo e no relato bíblico, inicialmente era caos e tornou-se cosmos, isto é, mundo. É bom lembrar que o termo cosmos em grego e a palavra latina mundo (mundus), etimologicamente, significam ordem, beleza, ornamento. Essas narrativas falam, pois, de uma passagem do caos ou desordem para a ordem e sentido. O universo apresenta-se originalmente na sua imensidão indefinida e caótica para a percepção e inteligência humana. Predomina no início o indefinido e a mistura num contínuo sem delimitação, como na frase atribuída a Anaxágoras: “em todas as coisas há uma porção de todas as coisas”. O aparecimento da linguagem vai produzir conhecimento e sentido. Vemos a importância da linguagem para aprender e descobrir o sentido nas coisas. Só a linguagem e o conhecimento devem pôr ordem no caos do pensamento, e estabelecer limites. Definir é, por certo, estabelecer limites. Esses limites definem as coisas e produzem conhecimento do mundo. Essa visão do mundo, no entanto, não é uniforme entre as pessoas. A língua ou linguagem, como meio de conhecimento, é fator de diferença cultural. A concepção do universo difere entre povos de língua diferente. Há limites mentais e culturais conforme a língua de quem quer compreender o universo. Quem estuda e compara línguas, percebe que o nome das cores e outros objetos não tem uniformidade entre os povos. Temos exemplos comentados por Hjelmslev (1975, p.207, 208).
3.Conhecer é analisar, é ver limites e diferenças

Quando percebemos alguma coisa, analisamos, vemos diferenças e entendemos sua natureza, adquirimos conhecimento. O conhecimento começa pelos órgãos sensoriais ou pelas sensações. Os sentidos externos, visão, audição e tato, põem as pessoas em comunicação com a grandeza indefinida do mundo material. Essa experiência sensível com as realidades concretas, singulares e individuais é a primeira forma de conhecimento, e todo conhecimento envolve significação, conhecer é, na verdade, encontrar significação, descobrir o sentido das coisas. Por isso Greimas (1976, p.11) afirma, em Semântica Estrutural, que “O problema da significação está bem no centro das preocupações atuais”.
E mais adiante (p.15), ele considera “a percepção como o lugar não lingüístico onde se situa a apreensão da significação”. Desse plano do conhecimento sensível, da percepção do mundo visível e concreto, passamos, pela capacidade de abstrair, para o plano do inteligível e conhecemos a natureza ou essência das coisas. A inteligência, numa atividade interna e imanente, produz e exprime em si mesma um conceito universal e abstrato das coisas singulares e individuais, que antes foram conhecidas nas suas qualidades sensíveis e apreendidas pelos sentidos. Essa forma de conhecimento do universal e abstrato é uma propriedade tipicamente humana. Forma-se, pela capacidade de abstração, uma idéia na qual se conhece a natureza ou essência universal de alguma coisa. A idéia, por sua etimologia, prende-se a um verbo grego, que significa “ver”. Ter idéia é ver o íntimo, a natureza de alguma coisa. Para essa operação do espírito ou inteligência usamos também o verbo conceber. ”Conceber é formar em si uma idéia, na qual se vê, atinge ou “apreende” alguma coisa. É pensar, por exemplo: “homem” ou “desconfiança” ou “infeliz”. (Maritain, 1994, p.19) O conceito é, portanto, uma idéia ou visão interior e intelectual de alguma coisa, uma noção ou conhecimento. Esse verbo conceber, relacionado com a idéia ou conceito, nos reporta de novo a Sócrates. A alma humana pode estar grávida da verdade. Assim como a mulher grávida necessita de parteira para dar à luz, as pessoas têm necessidade de ajuda, pelo diálogo, para conceberem as idéias e as manifestarem aos outros. Era a maiêutica socrática, arte de conceber e manifestar idéias.
É esse conceito, assim elaborado, é a primeira expressão da linguagem no íntimo das pessoas, isto é, no interior da inteligência, é uma apreensão e representação mental. Assim como pegamos com as mãos as coisas materiais e visíveis, pelos nossos conceitos apreendemos mentalmente a essência dessas mesmas realidades, e produzimos o conhecimento intelectual.
Quem conhece, em certo sentido, tem em si a posse da coisa conhecida. O que é conhecido existe imaterialmente naquele que o conhece, passa a ter uma existência intencional. Assim a perfeição de todo o universo ou a realidade de cada coisa poderá existir em forma de conhecimento num ser particular, no ser que conhece. Conhecer é uma modalidade de ser, o ser intencional. Conhecimento envolve consciência.
A inteligência, que conhece o mundo, conhece também a si mesma pela introspecção. “A inteligência que conhece é chamada a compreender, e enquanto compreende o mundo da matéria denomina-se percepção; enquanto compreende imaterialmente é chamada pensamento e intuição; compreendendo a consciência recebe o nome de introspecção.” ensina Madre Cristina (1961, p.91).
Por essa razão se percebe que o conhecimento tem algo de imaterialidade. A matéria reduz o ser a sua singularidade concreta nas suas dimensões palpáveis, uma pedra está reduzida a sua singularidade material. Cada ser em si mesmo, o ser humano inclusive, é, na sua individualidade, singular e incomunicável. O indivíduo, por ser indivíduo, não é dividido, é uno. Conhecer, porém, é dividir ou multiplicar a existência, é ser outro intencionalmente é um desprendimento do isolamento da matéria.
Conhecimento é, por isso mesmo, comunicação entre os seres, o conhecimento supõe comunicação e, portanto, linguagem. O conhecimento intelectual implica uma produção de um verbo mental ou conceito. Essa expressão na inteligência traz os elementos fundamentais da linguagem, e da comunicação, embora seja inicialmente uma comunicação ou linguagem interior.
A lógica tradicional já definiu o conceito como termo mental, os escolásticos medievais diziam em latim: “verbum mentis”, o verbo ou a palavra da mente.
Linguagem e semiótica. Esse lado imaterial do conhecimento, o sentido interior é a primeira exigência da linguagem, como atividade semiótica, linguagem como significação para comunicação, a linguagem comunica porque significa.
Houve uma concepção chamada behaviorista, ou corrente da psicologia que apenas considerava o comportamento exterior e negava a consciência e o sentido interior. Era uma atitude chamada positivista ou antimentalista, que negava ou deixava de lado o pensamento, o conceito. Essa teoria psicológica foi aplicada em lingüística por Bloomfield, nascido em Chicago em 1887. “Este “antimentalismo” é um termo expressivo, que designa somente a atitude positivista levada a um desenvolvimento limite, o determinismo exigente da época, também chamado mecanicismo ou fisicalismo - que Marx e Engels designaram por materialismo mecanicista ou vulgar. Consta primeiramente de um esforço, exercido na mesma direção de Whitney, tornando a análise lingüística tão científica quanto possível delimitando-a no seu próprio terreno. “O lingüista”, escreve Bloomfield, “ocupa-se unicamente dos sinais lingüísticos”. “Não é competente para se ocupar dos problemas de fisiologia ou neurologia”. (Apud Georges Mounin, A Linguística do Século XX, 1973, p.121)
A teoria de Bloomfield era claramente materialista, deixa de lado a consciência que considera inacessível. Para esse lingüista, a comunicação entre as pessoas não passa de um jogo de estímulos e reações. Alguns diziam na área da psicologia que: “A alma é uma noção supersticiosa; ninguém jamais a viu no fundo de uma proveta”. “A consciência nunca foi atingida pela vista, tato, gosto... A psicologia científica não pode deter-se em impalpáveis como sensação, vontade, sentimentos... Assim como a astronomia desacredita os horóscopos, a psicologia desconsidera a consciência” (Watson, apud Madre Cristina, 1962, p.42).
Nos Estado Unidos, com a publicação de Language de Bloomfield em 1933, surgiu a teoria materialista que deixa de lado a consciência na explicação da teoria da linguagem e comunicação. A comunicação seria explicada, conforme Bloomfield, pelo comportamento exterior das pessoas, pelos estímulos e reações, os problemas semânticos não pertencem aos estudos de lingüística. O lingüista devia tratar a linguagem da mesma maneira como os behavioristas faziam com o comportamento humano. Bloomfield, na esteira desses teóricos do positivismo, colocava a linguagem como objeto de pura observação e descrição objetiva, em oposição à abordagem mentalista. O princípio dos neopositivistas era: só têm sentido as proposições que podem ser verificadas pela experiência. A semântica era a “parente pobre da lingüística” (Greimas, 1976, p.12). Muitas eram as teorias contra a idéia ou concepção de sentido. “O golpe de misericórdia lhe foi dado finalmente pelo triunfo de uma certa concepção da lingüística que se apoiava sobre a psicologia do comportamento. É conhecida a famosa definição do signo lingüístico dada por Bloomfield (Language): “uma forma fonética que tem sentido” (p.138), “um sentido do qual nada se pode saber” (p.162). (Greimas,1976,p.13) Contra essa concepção que nega à semântica qualquer sentido, temos a crítica de Jakobson, “Ainda há pessoas que dizem que as questões de sentido não têm sentido para elas, mas, quando dizem “não tem sentido”, de duas, uma; ou sabem o que querem dizer, e eo ipso a questão de sentido adquire sentido, ou então não sabem, e então sua fórmula se torna sem sentido” (Jakobson, Lingüística e Comunicação. 1969, p.29). Essa teoria ou corrente lingüística pretende doutrinar que a linguagem não atinge o interior da pessoa, a vida subjetiva. As influências são apenas estímulos para o comportamento visível das pessoas. O psiquismo, com toda sua riqueza interior, fica reduzido ao comportamento externo. Educar seria quase condicionar reflexos, provocar estímulos para atividade externa.

4. Extensão e compreensão, a hiponímia
Esses dois conceitos extensão e compreensão são fundamentais numa teoria lingüística, fundamentais para uma teoria do conhecimento e formação cultural das pessoas. Conhecer é compreender o mundo. O conhecimento humano, pelo seu poder de abstração, supera as limitações do conhecimento sensorial. O conhecimento sensorial atinge a realidade sensível, material, concreta e singular, é conhecer apenas aquilo que os sentidos apresentam. O conhecimento intelectual apreende a essência ou natureza de alguma coisa. Apreende o aspecto inteligível da realidade, produz o conceito, que é a compreensão mental dessa realidade. Esse conceito, que é uma representação mental do objeto, é o mesmo que a idéia ou a noção abstrata que se forma na mente. O conceito é, portanto, a compreensão ou o conjunto de notas ou características de alguma coisa. É o mais elevado grau de imaterialidade para a compreensão de alguma coisa, o conceito é abstrato. Por outro lado, podemos pensar num conjunto de indivíduos, aos quais esse conceito se refere, esse conjunto é chamado de extensão do conceito. O conjunto de indivíduos, que estão incluídos numa compreensão ou definição, recebe, às vezes, a denominação de hiponímia, porque se trata da organização do vocabulário. Uma palavra pode estar incluída na definição de outra, assim a palavra gato está incluída na definição de animal, todo gato é animal. Quanto maior for a extensão de um conceito, menor será sua compreensão, a extensão depende da compreensão. A extensão do conceito animal é maior que a extensão do conceito gato e de homem, todo homem e todo gato é animal, mas nem todo animal é homem ou gato. A compreensão do conceito homem é maior que a compreensão do conceito animal, o homem é animal, mas animal racional, por isso a extensão do conceito homem é menor que a extensão do conceito animal.
Homem é hipônimo em relação a animal, que é hiperônimo. Hiperônimo é o termo de maior extensão. Toda compreensão do conceito está relacionada com a extensão desse mesmo conceito, numa razão inversa, quanto maior a compreensão, menor a extensão e vice-versa.. Conhecer uma natureza é conhecer os elementos que constituem uma essência. Saber a compreensão de alguma coisa, é saber sua definição, definição que se pode aplicar depois a todos os indivíduos singulares nos quais essa noção se realiza. Definição que não deve ser entendida, no entanto, desde essa primeira apreensão do objeto, ou conhecimento, como uma definição perfeita ou compreensão total e exaustiva da realidade. O conhecimento começa com as primeiras noções vagas e gerais com a possibilidade infinita de aperfeiçoamento. Atividade inicial bastante imperfeita, com possibilidade ilimitada de se completar, embora sempre inconclusa.
5.Significação e comunicação
O conhecimento, ao contrário da teoria do comportamento, é fato interior, é um saber que se forma na mente ou íntimo das pessoas, que podem comunicá-lo pelos atos de linguagem. Haverá um percurso, a partir do primeiro contato experimental com as coisas singulares do mundo, isto é, depois do conhecimento sensível, a inteligência irá produzir em si um conhecimento interior, um conceito intelectual e universal.
Esse conhecimento interior subjetivo poderá ser expresso em linguagem, porque ele é elaborado por conceitos e idéias. É um conhecimento comunicável, um saber comunicável. Não se pode comunicar aquilo que é estritamente material. Não se consegue comunicar igualmente um conhecimento intuitivo e totalmente pessoal. Há, pois, um saber comunicável e um saber incomunicável. Uma coisa material só se comunica passando de mão em mão como uma moeda. A experiência individual sobre coisas concretas igualmente não se transmite, e, como tal, é incomunicável. Não se transmite na sua singularidade material uma sensação de calor ou frio, de dor ou prazer.
Uma intuição espiritual é totalmente subjetiva. Toda realidade singular, individual e pessoal é em si mesma incomunicável. Podemos apenas dar pistas dessa realidade pela elaboração de conceitos. Só o conhecimento por conceito torna possível a linguagem e comunicação. A realidade espiritual só se comunica pelo conceito e linguagem. Só se comunica o que pode ser reduzido a sinal ou signo Todo conhecimento deve ser acompanhado necessariamente de linguagem, linguagem interior e linguagem exterior. O conhecimento, quando consciente, se realiza numa expressão de linguagem. Podemos, portanto, admitir como postulado a simultaneidade do conhecimento intelectual e da linguagem. Não há conhecimento intelectual sem linguagem e não há linguagem sem conhecimento expresso em conceitos. O ato exterior de linguagem traduz esse sentido interno e possibilita a comunicação e entendimento mútuo entre os interlocutores. Comunicação essa que nem sempre consegue ser perfeita, pode ser ambígua, ou seja, nem sempre revela adequadamente a intenção do sujeito enunciador, intenção que pode ser interpretada de várias maneiras.
Mas isso não invalida o fato de que houve uma intenção de produzir e transmitir um sentido interior pelos atos externos de linguagem. Nunca é demais dizer que a comunicação, que produz e transmite sentido, é ato social. Quem assume o ato de linguagem se apresenta como “eu” perante o outro, “tu”, e refere-se ao assunto, “ele”.
Aqui tocamos nos primeiros elementos para uma definição de linguagem, ou, com Jakobson, estamos “à procura da essência da linguagem” (1969, p.98), a linguagem como significação e significação para comunicação. A linguagem e semiologia se relacionam. Linguagem e comunicação pressupõem sinal ou signo e parceiros. Comunicação pressupõe vida social ou parceiros da comunicação, com o que concorda Bakhtin, quando afirma (2004, p.70): “Com efeito, é indispensável que o locutor e o ouvinte pertençam à mesma comunidade lingüística, a uma sociedade claramente organizada.” Os sujeitos da mesma comunidade lingüística, em atividade de comunicação, devem ter conhecimentos prévios, conhecimentos que se realizam na mente em forma de imagens ou de conceitos abstratos, e devem ter um sistema comum de sinais ou signos através do qual os conceitos e imagens interiores se manifestam nos atos de linguagem. Poderíamos lembrar uma nota de rodapé apresentada por Coseriu (Sincronia Diacronia e História, 1979, p.65), citando Gabelentz: “Regularmente serve a língua à comunicação, isto é, a duas partes, entre as quais deve intermediar: o eu e o tu. Por isso ela é dependente dessas duas partes: eu tenho que falar de tal forma que tu entendas, senão a minha fala perde o seu objetivo. Em outras palavras: a tua língua tem que ser a minha, e eu tenho que falar mais ou menos como tu estás acostumado a falar e também a ouvir falar. Este hábito fundamenta-se na tradição, e nós dois estamos presos a esta tradição”. Assim traçamos um caminho percorrido desde a percepção sensível do mundo, passando pela compreensão mental, até a manifestação pela linguagem, que é uma atividade individual e coletiva, linguagem interior e linguagem exterior.
6. O signo
Do fato interior e misterioso do pensamento, da vontade subjetiva, da imaginação e emoções na intimidade do psiquismo, deduzimos a necessidade de uma manifestação externa de toda essa riqueza do indivíduo. Prevemos a necessidade da linguagem.
O saber é atividade imanente ou interior, pois saber é construir pela inteligência o sentido das coisas. A única maneira de ser manifestado esse pensamento interior e vida íntima é por um sinal material externo, ou signo. Desde a época da filosofia escolástica medieval o signo está sendo estudado no campo da lógica, signo como instrumento ou meio de conhecer. “O signo lingüístico une não uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma imagem acústica” Essa é uma afirmação no Curso de Saussure (1969, p.80). O signo é essa entidade material, sensível, externa, que revela o saber interior ou o sentido elaborado pelo conceito mental. O signo é material e imaterial numa mesma unidade. São duas realidades, imagem acústica e conceito, duas faces de uma única entidade. Hjelmslev chama de função semiótica a função do signo entre duas grandezas, a expressão e o conteúdo. A significação é a finalidade ou causalidade final do signo.
O signo pertence à categoria do sinal, entidade semiótica, cuja função é indicar, apontar, transmitir mensagens, informar, interrogar, dar ordens. Do sinal veio o signo. O sinal se manifesta em várias modalidades, pode ser um índice, um vestígio, pode representar fisicamente ou simbolizar, realizando o que se denomina ato sêmico ou função semiótica. A origem grega desse termo “semiótica” está na Antiguidade. Galeno de Pérgamo, no séc. II d.C., médico erudito em seu tempo, empregava o termo “semiótica” para a arte do diagnóstico ou observação de sintomas das doenças. (AP. Bailly, Dictionnaire Grec Français, 1969). Do mesmo radical, o termo “semeiosis”, além de significar observação médica, designava já na Antiguidade, a ação própria do sinal, isto é, marcar ou indicar alguma coisa. Teorias sobre o sinal surgiram desde a Antiguidade. Nöth, em Panorama da Semiótica ( 1995 p.25) ensina que “Para designar uma teoria geral dos signos o termo já havia surgido alguns decênios antes que Locke, em 1690, postulasse uma doutrina dos signos com o nome Semeiotiké.” Modernamente, depois de Saussure, encontramos o termo Semiologia. Barthes, falecido em 1980, defensor da semiologia, escreveu em 1964, Elementos de Semiologia. Os fenômenos da significação são mais amplos que fenômenos puramente lingüísticos, porém, enquanto Saussure considerava a lingüística um ramo da semiologia, Barthes discorda ao afirmar que a semiologia é um ramo da lingüística porque aproveita dos conceitos da linguagem para o estudo da significação geral. Sem entrar nesse debate, podemos dizer que Saussure tem razão ao considerar a lingüística um ramo da semiologia porque a abrangência da lingüística é mais restrita, o signo lingüístico é de natureza oral ou acústico, enquanto a semiótica ou semiologia se vale de qualquer tipo de sinal. Certos autores distinguem Semiótica e Semiologia, outros consideram equivalentes esses termos, mas tornou-se muito comum o termo Semiótica para estudo dos signos ou sinais. O signo é, pois, uma categoria de sinal, sinal é termo genérico. A natureza do sinal é a significação, isto é, significar ou levar alguém ao conhecimento de alguma coisa. A finalidade do signo ou sinal é referir-se, dizer respeito a. O signo é um instrumento cognitivo. Significar é construir sentido ou conhecimento na mente das pessoas, e pode implicar uma referência ou direção a um referente existencial, ou fictício. Significar é, pois, produzir sentido, ou conhecimento na mente do ouvinte ou leitor, esse sentido é de natureza imaterial, interior. É um entendimento que se dá no íntimo da pessoa. Quando alguém diz “eu entendi”, realizou-se o sentido ou conteúdo mental, mesmo que esse conteúdo mental não tenha o rigor da lógica ou do bom senso. O sinal e o signo operam para produzir sentido. Em Santo Agostinho encontramos uma definição de sinal que se tornou clássica. “O sinal é, portanto, toda coisa que, além da impressão que produz em nossos sentidos, faz com que nos venha ao pensamento outra idéia distinta” (A doutrina cristã, 2002, p.85). Ele apresenta alguns exemplos: a pegada que lembra um animal, a fumaça que faz pensar no fogo, o tom de voz que manifesta o estado de ânimo de pessoa ou animal, o som da corneta que alerta os soldados numa manobra militar. Agostinho distinguia o sinal natural do sinal convencional, distinção retomada por Okham, conforme U. Eco (O Signo, 1977, p.40). Convencionais são os sinais emitidos conscientemente com intenção de comunicar alguma coisa. Os sinais naturais surgem da natureza das coisas, uma fonte ou causa natural, são os indícios, vestígios encontrados pela experiência, e sintomas, uma pegada da pata de animal, um calor de febre. A informação não intencionada precisa ser, nesses casos, deduzida e reconhecida. Agostinho aqui é mais um semiótico que lingüista Antes de continuar tratando do signo seria conveniente falar dos termos “sinal e signo” e discutir a natureza de cada um
A língua latina conhecia o termo “signum” (do gênero neutro) para significar a “marca”, o “sinal”. “Signum” podia ainda ser também “prova”, “imagem”, “estátua”. Assim “imprimere signa pecori” era uma expressão para designar a atividade de “marcar o gado”. O sinal marcado no couro do animal indicava o proprietário. “Signa pedum” equivalia a “sinais de pés, pegadas”. “Signa tabellis imprimere” queria dizer “imprimir sinais nas tabuinhas usadas para os escritos”, conforme se encontra no antigo dicionário Saraiva. O sinal remete por isso para o conhecimento de outra coisa, primeiro se vê o sinal, depois se deduz o objeto ao qual ele se refere. O verbo “insignire” é marcar com um sinal, e “significare” é indicar ou anunciar por meio de sinal, e exprimir pelos sinais, que são as palavras, isto é, simplesmente significar. No latim tardio encontramos o termo “signale”, adjetivo neutro de “signalis” derivado de “signum” que nos deu a palavra “sinal” com o mesmo campo semântico, isto é, “tudo aquilo que serve de sinal”. De “signum” veio também o verbo “signare”, igualmente “marcar com um sinal, ou indicar por meio de sinal”. O sinal é, portanto, marca distintiva, e também, na comunicação intencional, um sinal material pelo qual as pessoas indicam alguma coisa para alguém, é um meio de reconhecimento. Daí temos palavras derivadas como designar, assinalar, sinalização. Insigne é o que tem uma marca particular, portanto notável, ilustre. A palavra “ensino” tem seu radical no verbo latino “insignire”, que havia mudado para “insignare” no latim vulgar com o significado de instruir, informar. Niedermann, em Phonétique Historique Du Latin (1953, p.54), relaciona a etimologia de signum a “ *secnom”, da raiz do verbo “seco”, que significa “eu corto, eu entalho”, isto é, a atividade de gravar, esculpir que alguém fazia para assinalar e produzir comunicação através de marcas ou sinais. Alguém corta a madeira e deixa pelo corte uma marca para sinalização. O termo signo, da mesma origem etimológica de sinal, é erudito de uso mais técnico e restrito. Na edição brasileira (1969) do Curso de Lingüística Geral, tradução do Cours de linguistique générale de Saussure, encontramos o termo “signo lingüístico”, para traduzir “signe linguistique”. Assim passou haver diferença entre os termos “sinal” e “signo. “Signo” possui definição e emprego bem preciso em Linguistica. Saussure insiste: ”Chamamos signo a combinação do conceito e imagem acústica: mas, no uso corrente, esse termo designa geralmente a imagem acústica apenas, por exemplo, uma palavra (arbor, etc) (1969, p.81) Esse uso corrente, a que se refere Saussure, o signo como palavra no seu aspecto apenas de significante, é a mesma antiga tradição mencionada por Hjelmslev (1975, p.203) ”segundo a qual um signo é, antes de mais nada, signo de alguma coisa.“ Essa definição tradicional, ou uso corrente do termo signo, identifica signo com palavra, que é a expressão (significante) de uma realidade exterior ao próprio sinal, nesse caso, signo ou sinal de um referente.
O signo, depois de Saussure, se define como uma unidade, um todo formado por dois elementos inseparáveis, significante e um significado, não há significante sem significado, nem significado sem significante. O signo não é apenas a imagem acústica do significante, a sonoridade, por exemplo, da palavra “árvore”, o que seria, nesse caso, considerar o signo como nomenclatura. Um nome para evocar o conceito de “árvore”. Na teoria de Hjelmslev, o signo se caracteriza pela função semiótica realizada pela expressão e conteúdo, que só existem numa unidade. Não existe significante sem significado, nem expressão sem conteúdo. No signo, assim entendido como unidade significativa entre significante e significado ou expressão e conteúdo, a inferência cognitiva é imediata. Quando pronunciamos, por exemplo, a palavra “árvore” (imagem acústica), simultaneamente ocorre o conceito ”árvore” (Curso, p.81). Ou, melhor dizendo, significado (conceito) e significante (imagem acústica) acontecem num mesmo ato sem nenhum processo de tradução. Outra é a função dos sinais, haverá sempre uma dedução ou tradução, são dois conhecimentos relacionados, um é conhecimento do sinal, outro é o conhecimento do objeto sinalizado. Conhecido antes o sinal, a mente em seguida reconhece o objeto referido no sinal. A reflexão sobre o sinal e signo lingüístico, que pode continuar indefinidamente e vamos encerrar, nos coloca entre as questões fundamentais da linguagem, a linguagem como significação e conhecimento. O signo é instrumento de comunicação e cognição. Os signos realizados na enunciação abrem o caminho para a cultura e convivência social. Muito já se falou dos efeitos que a significação das palavras tem para a vida humana. Ao lado da boa argumentação, pode existir a manipulação da palavra. Neuroses, angústias e outros males da vida social parecem ter sua origem no mau uso do vocabulário. As palavras exercem domínio sobre os homens, podem causar mal-entendidos, desordem mental. Podem, no entanto, produzir efeitos benéficos e terapêuticos. Podemos concluir com Dante Tringali (1988, p.183). “De qualquer forma, o homem necessita tomar posição crítica diante das palavras, não ser escravo, mas senhor delas, o que obriga a conhecê-las a fundo, em todos os seus estratos diacrônicos e sincrônicos. A definição identifica a alma da palavra. O conhecimento diminui a força das palavras que se deixadas a si criam deuses: “nomina, numina”. Não se entende que o homem se aliene às palavras quando elas procedem dele”.
Referências bibliográficas
A Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas, 1991.
AGOSTINHO, Santo. A Doutrina Cristã. São Paulo: Paulus, 2002.
BAILLY, A. Dictionnaire Grec Français. Paris: Hachette, 1969.
BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 2004.
CHARAUDEAU, Patrick. Linguagem e discurso. São Paulo: Contexto, 2008.
COSERIU, E. Sincronia, diacronia e história. São Paulo: Presença (USP), 1979.
CRISTINA MARIA (Madre). Psicologia científica geral. Rio de Janeiro: Agir, 1962.
DESCARTES, R. Discours de la Méthode. Paris: Bordas, 1996.
DUCROT, O. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.
ECO, U.O Signo. Lisboa: Presença, 197

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