sexta-feira, 10 de junho de 2011

MUDANÇA CLIMÁTICA FREIA PRODUÇÃO DE GRÃOS



Há trinta anos a mudança climática freia a produção mundial de grãos

Os efeitos negativos do aquecimento global sobre a agricultura não são uma perspectiva distante para o futuro, mas sim uma realidade do presente. Em resumo, essa foi a principal mensagem de um estudo conduzido por diversos pesquisadores americanos e publicado na sexta-feira (6) pela revista “Science”.


stéphane Foucart






Ativistas usam máscaras de líderes políticos mundiais durante protesto contra o aquecimento global, na Alemanha

Ao conduzir uma análise retrospectiva da produção mundial dos três grãos mais importantes (milho, trigo, arroz), bem como da soja, David Lobell (Universidade de Stanford, Califórnia) e seus coautores sugerem que a evolução das temperaturas e das chuvas entre 1980 e 2008 tenha causado a redução do rendimento médio mundial dos cultivos de trigo e de milho, em respectivamente 5,5% e 3,8%.

Esses números, apesar de elevados, não devem ser interpretados com uma queda nítida de produtividade, mas mais como uma perda de ganhos, no conjunto do período estudado, de cerca de 23 milhões de toneladas para o milho e 33 milhões de toneladas para o trigo. A evolução do clima há trinta anos de forma geral não teve impacto negativo sobre as culturas de soja e de arroz.

“Trata-se de um trabalho importante, pois é a primeira vez que uma avaliação como essa é tentada em nível mundial”, acredita Jean-François Soussana, diretor científico para o meio ambiente no Instituto Nacional da Pesquisa Agronômica (INRA). Isso é ainda mais importante pelo fato de que as quatro culturas analisadas estão, como dizem os pesquisadores, na base de cerca de “75% das calorias consumidas diretamente ou indiretamente pela humanidade”.

O exercício tentado é complexo: no período analisado, os climas regionais certamente evoluíram, mas também as práticas agrícolas, as variedades semeadas, a quantidade e a natureza dos insumos (pesticidas, adubos), etc. David Lobell e seus coautores observaram, região por região, a evolução das chuvas e das temperaturas durante a estação vegetativa. Em seguida eles utilizaram um modelo de resposta de cada cultura a essas mudanças, para extrair das variações de produção a parte imputável ao clima.
Os resultados variam muito em função das culturas e das regiões. A América do Norte foi a mais poupada, uma vez que o rendimento não foi afetado pelo clima em trinta anos. Já a China e o Brasil viram o rendimento do cultivo de milho perder entre 5% e 10%; a Índia e a França lamentam um prejuízo de cerca de 5% sobre o rendimento de suas culturas de trigo – de qualquer forma menos que a Rússia, que, de maneira contraintuitiva, perdeu 15% de rendimento sobre esse grão. A soja é a mais afetada no Brasil, que, nesse campo, perdeu cerca de 5% de rendimento sobre essa leguminosa, muito importante para a produção animal.
A meu ver, é um dos principais ensinamentos desses trabalhos: perdas de rendimento são constatadas em toda parte, sem distinção de latitude”, diz Soussana, coautor do último relatório do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Evolução do Clima (GIEC). “Até agora, pensávamos que os efeitos negativos da mudança climática seriam importantes sobretudo para as culturas da zona tropical. Mas não parece ser o caso.”
Embora seja baseado na análise estatística de dados agronômicos e climáticos que às vezes sofrem de grandes incertezas, especialmente nos países em desenvolvimento, o estudo de Lobell é corroborado, localmente, por análises mais delicadas conduzidas em território francês. Esses trabalhos, dirigidos pela agrônoma Nadine Brisson (Unidade Agroclim, INRA) e publicados no final de 2010 na revista “Field Crops Research”, são “de maneira geral coerentes” com aqueles que acabam de ser divulgados na “Science”, segundo Soussana.

ssa análise observou na França uma estagnação no rendimento do trigo desde meados dos anos 1990. No entanto, este não parava de aumentar desde o fim da Segunda Guerra Mundial.



Uma das causas apresentadas pelos pesquisadores franceses era que os efeitos do aquecimento global começavam a ser sentidos na agricultura cerealista desde os anos 1990, levando a uma perda estimada entre 20 e 50 quilos de trigo por hectare ao ano.



Essa constatação pode ser extrapolada, segundo os autores, para boa parte da Europa. “A perda de rendimento devido à degradação das condições climáticas se soma a outros fatores, puramente agronômicos, como mudanças na rotação das culturas ou a utilização de fertilizantes”, explica Soussana. “Esses efeitos negativos são, no entanto, compensados pelos lucros obtidos graças à melhoria genética das variedades que permite ganhar, ainda hoje, cerca de 100 quilos de trigo por hectare ao ano”. Isso explica a estagnação observada, uma vez que os progressos da ciência agronômica são parcialmente “apagados” pelo aquecimento global e pelos episódios de seca.
Seriam os efeitos do clima sobre a agricultura desde 1980 capazes de permitir que se preveja o que acontecerá nas próximas décadas? “Na verdade, não, pois isso também será função do esforço de adaptação que será feito”, responde Soussana.



Tradução: Lana Lim

(Extraído do Boletim Controvérsia - Editado por Ricardo Alvarez







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